Raquel Delvaje

sábado, 9 de fevereiro de 2013

MISTÉRIO XXV - O SINISTRO RITUAL MACABRO.





                 Quando Marina cruzou a rua da periferia de Campinas, trazia seu coração acelerado, experimentava o medo por caminhar pouco menos da meia noite num lugar tão obscuro, entretanto, estava decidida.  Fazia um mês que ela conhecera Rodrigo Alves, homem jovem, rico e bonito que estava sempre nas colunas sociais. Após se conhecerem, a moça pobre se encantou com o rapaz. Ela era alta, morena e de olhos cor de mel, despertava a atenção por sua formosura, porém, nunca dava sorte com nenhum homem, acabava sendo mais uma aventura. Com Rodrigo, no início se sentiu desejada, mas após uma semana percebeu que o seu novo afeto já não a correspondia, chateada, buscou muitos meios de conquistá-lo, mas foi em vão.
                   Um dia foi conversar com uma mandingueira que disse a ela que fizesse um trabalho e teria seu amor retribuído por sete anos e se fosse bem feito, apropriar-se-ia de riquezas. A apaixonada aceitou a proposta e era justamente isso que estava indo concretizar na noite escura e gelada. Não havia ninguém nas ruas e estava à procura de uma chácara abandonada que tinha uma enorme árvore antiga, que foi por muitos anos abrigo de rituais macabros. Precisaria chegar antes de completar meia noite e sair de lá somente ao amanhecer. Levava consigo um gato preto que deveria enterrar vivo ao pé da velha árvore.
                   Ao deparar com o portão antigo de ferro e os muros altos, teve dúvida de como entraria, porém percebeu que o cadeado estava aberto, puxou a grossa corrente enferrujada e adentrou-se, fechando-o novamente. Sentiu um calafrio terrível, o medo a dominou. A escuridão da noite de lua minguante fazia tudo ficar mais tenebroso. A árvore gigante estava à sua frente fazendo uma sombra carregada e ela não conseguia distinguir nenhuma imagem naquela penumbra, as luzes dos postes ficaram para trás, na rua, e ali ela só tinha o breu como companhia. Sentou-se na grande raiz e olhou no relógio, faltavam dez minutos e tinha que aguardar completar meia noite.
                  De repente, arrependeu-se pela decisão que havia tomado, quis ir embora, foi até a saída e misteriosamente estava com o cadeado fechado, estremeceu de medo. Tentou escalar o portão, mas era muito alto e tinha lanças pontiagudas. Principiou a chorar em desespero, queria sair dali, mas não conseguia. Quando olhou no relógio, viu que era meia noite e começou a gritar que alguém a socorresse. Veio um velho do fundo da chácara e a acalmou dizendo que não se preocupasse, ele ia buscar a chave. Marina ficou aliviada com aquele homem com a barba por fazer, vestindo roupas surradas e com chapéu de palha, com jeito de caipira. Sentiu confortar seu coração com a presença, acompanhou-o e ao aproximar-se do arvoredo ele pediu para que ela o esperasse ali, não tinha perigo nenhum, ia até o casarão pegar as chaves. A moça assentou-se novamente no mesmo lugar de antes e estava aliviada, mas bastou o homem sumir na escuridão e seu coração disparou. Pensou em correr atrás do matuto, mas se conteve, pois não sabia exatamente o que havia à frente, o breu dominava tudo. Resolveu fazer uma pequena fogueira para espantar o frio e a escuridão.
                     Ao levantar a cabeça, viu uma senhora se aproximando com um bebê, colocou-o no pé da árvore e tirou uma faca da cintura e enfiou no coração da criança. Assustada, Marina gritou e tentou tirar a faca das mãos da mulher que a olhou com sua face desfigurada, comida por vermes.
                     - O que você fez – Gritou marina  - Você é louca.
                 
                      Segurou-a pelos pulsos, tentando evitar que ela esfaqueasse mais o recém-nascido e essa a jogou longe com uma força abissal. Pegou a criança e bebeu seu sangue como se fosse um animal faminto, após, comeu lhe a carne saciando-se e a moça horrorizada assistiu a cena caída ao chão ao lado do fogo que quase a queimou. Apareceu o velho com um molho de chaves e ela correu aos seus braços, chorando e denunciando o que havia visto.
                       - Não se assuste! Isso é normal por aqui, com o tempo você se acostumará – disse o velho.
                       Ao olhar para ele, já não era mais o homem que havia visto, estava transfigurado, tinha uma cara extremamente enrugada e os olhos vermelhos como brasa, estava mais magro, quase uma caveira, suas mãos estavam compridas e com enormes unhas. Pegou o que restou do bebê e comeu faminto e riu satisfeito. Marina começou a chorar e correr. Foi facilmente alcançado pelo velho que rasgou sua carne com as unhas afiadas e levou-a de volta para a árvore e disse:
                       - Agora você escolhe, ou come o bebê ou será comida por nós.
                      Olhou à sua volta e viu várias pessoas e outro recém-nascido pronto para ser sacrificado. Ela sangrava com o ferimento em suas costas. Entre as pessoas estava Rodrigo, Marina ficou abalroada ao ver seu amado ali entre as aberrações e ele estava horrível e lhe sorria e dava as boas vindas ao mundo do sucesso. O seu amado estava com uma aparência sombria e seu rosto não tinha mais a beleza, era um rosto profundamente magro e em sua cabeça tinha apenas alguns fios de cabelo, em contraste à bela cabeleira negra de outrora, seus dentes amarelos e raros e a pele cinza. Ele estava bebendo o sangue quente do gato preto que havia sacrificado naquele momento. Marina pegou o bebê, todos sorriram, uma vez que sabiam que ia sacrificá-lo, mas num ímpeto a moça correu com a criança no colo atiçando a ira de todos os presentes. Fugiu e conseguiu se esconder no casarão e viu quando todos a procuravam ensandecidos. Conseguiu se embrenhar no mato e alcançou o rio. Ficou escondida quieta enquanto o pequeno bebê dormia tranquilamente, agasalhado em uma  manta.
                       Ao amanhecer o dia, voltou para sua casa e não sabia o que fazer, pensou em ir a uma delegacia, porém teve medo, não sabia o que aconteceria com os dois. Estava cansada demais para pensar em alguma coisa. Deitou exausta na cama para dormir e acordou com alguém batendo na porta e ao abrir era  Rodrigo, todo sedutor, dizendo que a amava e que gostaria de viver com ela e  que abandonaria a vida errante. Marina se entregou ao amor, seduzida pela paixão. Entraram duas pessoas despercebidamente ao outro quarto e devoraram a criança, arrancando-lhe a cabeça para levar ao novo ritual noturno, quando a moça percebeu o movimento em sua casa, foi ao outro cômodo e se deparou com aquelas pessoas com a boca ensanguentada e rindo diabolicamente. Ela, revoltada, atacou  a todos com fúria e Rodrigo se transformou com garras e rasgou sua carne, lambendo os dedos e se saciando com seu sangue. Ela olhou para ele e jurou vingança. Ele riu incrédulo. E a matou sem piedade.
                       A polícia encontrou o corpo e pelas investigações chegou facilmente ao moço que foi preso.
                         Rodrigo ordenou que o capeta fosse visitá-lo, pois tinham um trato. Após uns quinze dias que ele estava na prisão, recebeu a visita de um homem bem vestido que se apresentou como advogado e ao chegar à cela foi logo cobrado pelo rapaz furioso que disse que ele tinha obrigação de protegê-lo. Esse, calmamente, olhou-o com olhar frio e penetrante e respondeu.
                 - Você já ganhou o que queria, nosso trato era de sete anos, agora é isso ou a morte!
                   O moço ficou aturdido quando percebeu a cilada que estava. E quando olhou para o capeta, viu atrás, a moça rindo feliz, pois se aliara ao demônio e pediu vingança pela sua morte em troca de sua alma.
                  Naquela noite, ela estava lá na chácara, comendo e bebendo carne e sangue ofertado por mais um ganancioso que faz qualquer coisa por riqueza, sucesso e amor.
                  E quem passa por aquelas bandas à meia noite sente um calafrio e avista ao longe aquele pequeno ritual macabro.

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